Série PANCs - carqueja e sálvia-azul

Que se usa a carqueja e a sálvia para fazer chá, todo mundo já sabe. Mas será que dá para fazer outra bebida? Por exemplo... cerveja? Alerta de spoiler: dá! Sálvia-azul e carqueja, plantas que podem servir como substitutas do lúpulo na produção da loira gelada, são destaque do terceiro episódio do "Matos Gourmet", a série sobre PANCs apresentada pela nossa jardineira Carol Costa, juntamente com o mestre taxonomista Harri Lorenzi e o chef Henrique Nunes, diretamente do Jardim Botânico Plantarum, em Nova Odessa (SP).

Carqueja é realmente muito amarga?


A visita começa quando nossa louca das plantas encontra uma baita touceira de carqueja (Baccharis trimera). O mestre Harri Lorenzi explica que essa planta cresce bastante, alcançando um metro facilmente. Após essa altura, a carqueja começa a ter ramos que crescem para os lados. Como as folhas são comestíveis até mesmo cruas, Carol não perde a oportunidade de experimentá-las. Se o chá de carqueja já é amargo, as folhas in natura são ainda mais. Mestre Lorenzi conta que a planta possui propriedades bacteriostáricas, ou seja, ajuda a controlar a quantidade de bactérias que existem, por exemplo, num líquido. Por conta disso, a carqueja tornou-se elemento essencial na cerveja produzida no Naiah, restaurante que fica dentro do Plantarum. O uso da PANC na bebida substitui o lúpulo (Humulus lupulus), ao dar o sabor amargo e controlar a proliferação das bactérias que fermentam a bebida.

Como cultivar e reproduzir a carqueja


A carqueja (Baccharis trimera) é uma planta perene, de fácil cultivo e nativa de campos de altitude, suportando bem ambientes abertos, onde há vento e uma certa escassez de água. A reprodução é fácil, feita por meio de estacas tiradas da base do caule, onde é possível encontrar seus pequenos rizomas. O enraizamento das estacas é, principalmente quando fixadas em areia úmida.

Sálvia-azul dá aroma e sabor à cerveja


A segunda planta alimentícia não convencional utilizada no preparo dessa cerveja tão inusitada é a sálvia-azul (Salvia guaranitica). Nossa jardineira Carol Costa não perde a oportunidade de experimentar tanto a flor (que é azulzinha), quanto a folha da planta. E, mais uma vez, ela confirma que ambas possuem um sabor beeeem amargo. Apesar de ser um tipo de sálvia, a sálvia-azul é bem diferente de outras espécies, exatamente pelo seu amargor característico. Aqui vai uma curiosidade: sabia que existem mais de trezentas espécies de sálvias?

Como cultivar e reproduzir a sálvia-azul


A sálvia-azul (Salvia guaranitica) é uma espécie nativa e perene, encontrada especialmente no sul do nosso país. É bastante cultivada como espécie ornamental, apesar de comestível (PANC). As suas folhas, flores e até mesmo suas raízes, que têm formato de pequenas batatinhas, podem ser consumidas, apresentando um característico sabor amargo. Apesar da planta produzir flores, conseguir sementes é uma tarefa bem difícil. Portanto, a forma de reprodução mais utilizada é a partir das raízes. Nas plantas mais velhas, abaixo do solo, é possível encontrar pequenos tubérculos que podem ser retirados e replantados em outro local, dando origem a uma nova sálvia-azul.

Duas plantas nativas para substituir o importado lúpulo


Depois de colher carqueja e sálvia-azul, nossa jardineira Carol Costa vai até a cozinha do Naiah para bater um papo sobre cerveja com o chef Henrique Nunes. Henrique explica que, como outras PANCs, carqueja e sálvia-azul apresentam sabores bastante concentrados, o que torna a sensação de amargor muito intensa. Por isso, para criar sua receita, Nunes realizou diversos testes e diluições até identificar a quantidade correta dessas plantas para chegar ao sabor desejado na cerveja. Nossa jardineira compara a forma de trabalhar os sabores com a arte de criar paisagens interessantes, utilizando plantas que, num primeiro momento, parecem sem graça e sem atrativos. Enquanto o chef utiliza o paladar, nossa louca das plantas usa o olhar. A partir de plantas extremas, ambos conseguem extrair o melhor que as espécies oferecem.

Preparando uma cerveja sem usar lúpulo


O processo para a criação da cerveja do Naiah é bem similar a outras variações da bebida, explica o chef Henrique Nunes. O malte é cozido e depois fervido. No lugar do lúpulo, a carqueja e a sálvia-azul entram no preparo. Pode parecer heresia para mestres cervejeiros tradicionais, mas o uso de plantas nativas é uma ótima sacada. Produzir lúpulo em um país tropical é inviável, já que a planta precisa de um clima mais frio.

O resultado de duas plantas tão amargas, que fariam qualquer um fazer careta, pode ser algo tão gostoso e refrescante quanto essa cerveja de carqueja e sálvia-azul. É de dar água na boca, não é mesmo? Mas, a pergunta certa seria: já que tem carqueja, a gente pode abusar um pouquinho mais na quantidade? Será que tem cerveja suficiente? Candidato para experimentar é o que não vai faltar!

Figurino:
Loja CAS
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Studio Drê Magalhães

Livros:
Plantas Alimentícias Não Convencionais (PANC) no Brasil
PANC Gourmet - Ensaios Culinários

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