Me espera, sibipiruna!
Assim que dobro a esquina de casa, dou de cara com ela, o tronco se esquivando da sombra projetada pela casa, a copa fazendo um dossel verde para a cama de asfalto, e elas, metade amarelo-gema, metade antenas negras, sintonizando o céu. A sibipiruna. A luz da Mata Atlântica, a árvore de florada tão intensa e bela que suas hastes precisam abrir em metades para não enciumar o sol.
A árvore que levei meses para descobrir o nome e que agora pronuncio com o orgulho do estrangeiro que fala Araçariguama sem gaguejar. São Paulo está amarela, onde a vista alcança, as ruas são sibipirunas impacientes espetadas no alto, sibipirunas melancólicas cobrindo o chão, numa poesia que faxineira nenhuma vê, imagina varrer aquela sujeira logo cedo, e amanhã cai mais um monte, e ai meu deus se venta.
Minha vida dupla de jornalista e jardineira tem me feito olhar as árvores com cobiça, essa ainda não fotografei, nossa, olha aquela ali, como a copa está bonita! Mas e tempo pra sair com a câmera boa, para flanar pelas ruas tropeçando sozinha, andar até ficar com dor no pescoço de tanto olhar pra cima?
Eu dirijo para o trabalho e, todo dia, sigo o mesmo roteiro mental. Puxa, a sibipiruna tá linda, as flores já estão quase na ponta! Não posso passar desse sábado. Nossa, essa casa tem alpínias florescendo! Que bom, ainda não terminaram de abrir, tomara que sábado não chova. Ah, essa trepadeira roxa eu ainda não tenho no álbum, aposto como é figurinha difícil de sair. Mas esses resedás de parzinho estão uma coisa, uma foto da dupla não seria nada mal. Ai, o jasmim-manga vermelho, morri! Será que a dona da casa deixa eu entrar pra fotografar? Caramba, que flor é aquela brotando na frente do hotel? Quando eu vier, vou perguntar na recepção, quem sabe eles podem informar o nome. Não pode passar desse sábado, faz um mês que estou tentando sair para fotografar e nunca dá.
E a coisa segue assim até eu entrar no estacionamento da empresa, subir três andares e dar de cara com ela, oferecendo-se ao clique, a copa roçando o vão do quarto andar, as flores caindo — ai, deus!, já está acabando a florada! —, amarelecendo um Palio, uma Strada, e outro Palio. Me espera, sibipiruna!