A história da produção de baunilha
"– Uns quinze anos atrás, meu pai foi convencido por um francês a investir numa plantação de baunilha no Taiti, mas a plantação não deu certo.
– O clima é perfeito e as trepadeiras cresciam, chegavam a dois metros de altura. Davam flores do tamanho de um punho, que vicejaram e morreram sem nunca der uma maldita fava. O que foi que deu errado?"
O diálogo acima foi extraído do livro A Assinatura de Todas as Coisas, de Elizabeth Gilbert, autora do best-seller Comer, Rezar, Amar. Apesar de ser uma ficção, o romance tem sólida base histórica, inclusive no que diz respeito à Vanilla, gênero de cerca de cem espécies das quais se extrai a baunilha.
A viagem da baunilha da América Central para à Europa
No livro como na vida real, essa orquídea trepadeira originária da América Central foi levada à Europa pelos espanhóis, onde seu inconfundível aroma conquistou a nobreza. No início do século XIX, botânicos e exploradores se lançavam em expedições ao México e à Guatemala, de onde retiravam mudas de Vanilla planiflora para cultivá-las no Taiti, Indonésia, Madagascar, Polinésia Francesa e em outras colônias de clima tropical.
Curiosamente, a planta prosperava bem nesses países, mas não frutificava. Só que era justamente a fava comprida, seca e fermentada que interessava, aquela maravilha gerada pela flor fecundada, onde uma alquimia de mais de 250 ingredientes ativos produz o mais caro aromatizante vegetal do mundo, a vanilina. Para se ter uma ideia, o extrato natural da baunilha pode custar US$ 4 mil o quilo, disputado a tapa por indústrias tão diversas quanto a de alimentos e a de perfumes. Nem toda a tecnologia foi capaz de suplantar a natureza, de modo que o aroma artificial de baunilha não chega aos pés do buquê produzido até mesmo por espécies consideradas menos aromáticas, como V. Java, V. tahitensis e V. Pompona, usadas na produção de charutos e cosméticos.
Fã de temperaturas que nunca ficam abaixo dos 20ºC, esse gênero de orquídeas aprecia sol direto pela manhã, alta umidade do ar e ambiente arejado. Suas folhas e caules são carnosos, dando à planta a aparência das suculentas. Se cultivada em terra bem adubada, a baunilha passa dos 2m de altura, produzindo flores amarelo-esverdeadas entre o segundo e terceiro ano de cultivo.
Porque as orquídeas de baunilha não dão favas?
E aqui voltamos à pergunta do romance: por que as baunilhas não dão flores fora de seu habitat natural? A resposta, dada corretamente por outro personagem, é que elas necessitam de polinizadores especializados para frutificarem – no caso, abelhas e beija-flores endêmicos da América Central, capazes de driblar a complexa morfologia da flor e levar com êxito os grãos de pólen ao ovário. É graças a esse trabalho eficiente que a baunilha encapsula e, depois de nove meses, está em ponto de colheita. Após esse período, a fava passa por três banhos em água quente, quase fervente, para começar o processo de fermentação e secagem que vai intensificar o perfume das minúsculas sementes.
Na impossibilidade de "importar" os polinizadores, os produtores de Vanilla recorrem a um artifício delicado e trabalhoso, a polinização manual artificial. É exatamente como soa: com um pincel e mãos ágeis, um trabalhador imita o inseto ou pássaro, "pincelando" flor a flor na tentativa de fecunda-las. Isso e mais os riscos de contaminação por fungos e bactérias durante o processo de secagem das favas torna o cultivo de baunilha extremamente elaborado – e caro.
Plantando baunilha na sua casa
No Brasil, especialmente na região amazônica e no que restou da Mata Atlântica, tenta-se ainda timidamente cultivar Vanilla planiflora apoiada em mudas jovens de seringueiras e limoeiros. Mesmo aqui, a polinização precisa ser manual e ainda tem baixa produtividade. Portanto, se quiser ter uma Vanilla em casa, não espere colher tão cedo os louros – ops, os frutos! – de um bom cultivo.